Interessa-me pesquisar a “biografia ficcionalizante” como elemento suporte de criação na arte e na literatura, seja através das minhas experimentações das “próteses sentimentais” – termo que desenvolvi para meus trabalhos que envolvem a tatuagem que introduz na pele a ontologia do devir e do despojamento –, bem como pela exploração de outros meios de expressão que derivam da ampliação dos princípios visuais para além da tela. Como iniciei meu processo artístico no teatro e minha formação acadêmica transitou – e ainda transita – entre as áreas de História da Arte e Artes Visuais, além da minha investigação na linguagem da performance oriunda pela organização e edição da eRevista Performatus e pela participação direta em trabalhos de performance de outres artistas, percebo que este meu percurso transdisciplinar é fundamental para pensar a pesquisa inicialmente citada que venho desenvolvendo no campo das artes visuais, especialmente em construções pictóricas em formato tradicional, em pinturas performáticas, fílmicas, escultóricas e cinéticas com tons autobiográficos, e seus desdobramentos na escrita.
Através da figura do Minotauro, Paulo* avalia a negatividade sexual de determinadas áreas do seu corpo e a vestimenta como um artefato ligado ao pudor, mesmo quando utiliza, de forma até abusiva, o adorno corporal, ao praticar a sutura de micropeças de roupas sobre o pequeno corpo de um Minotauro tatuado em seu antebraço direito. O vídeo exibe apenas o momento de despir a imagem, o desfazer das suturas que, simbolicamente (e também literalmente), machucavam a sua pele. Esse trabalho faz parte de sua série de Minotauros realizada entre 2010 e 2015: “El Minotauro #1” (uma polaroide de uma figura feminina a constituir um corpo antropozoomórfico apenas através da torção de membros da sua própria anatomia); “El Minotauro #2”(uma fotoperformance criada em parceria com o artista Manuel Vason, em que Paulo masturba-se na chuva, em meio à natureza, com chifres readymades arranjados a partir de uma carriola); “El Minotauro #3” (um cartão-postal em que Paulo exibe seu corpo explicitamente nu durante um ato de masturbação para driblar normas estabelecidas em repartições públicas, colocando em xeque os limites do conteúdo permitido em uma imagem que circula através dos serviços dos correios); “El Minotauro #4” (uma videoperformance em que o artista expõe uma caricatura de si mesmo como um ser híbrido através de um desenho fixado na sua pele pela técnica da tatuagem, onde apresenta-se metade animal, metade humano).
PELISON, Julia. “Seis Manifestos Irrevogáveis sobre a Pele de Paulo Aureliano da Mata”. eRevista Performatus, Inhumas, ano 3, n. 14, jul. 2015. ISSN: 2316-8102.
* Na época da criação da série El Minotauro, Hilda de Paulo ainda era conhecida por Paulo Aureliano da Mata. A artista começou sua transição de gênero em 2020, mudando de nome nesse mesmo ano.
A série de Minotauros foi realizada entre 2014 e 2015 e expõe uma caricatura da artista como um ser híbrido onde se apresenta como metade animal e metade humano.
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