Sumé Aguiar (1997) é artista, cineasta e transmutante. Desenvolve suas experimentações na performance e no audiovisual. Formade pela escola de arte e tecnologia Oi Kabum e graduande em Cinema e Audiovisual pela UFF. Atualmente sua pesquisa se direciona na investigação do choque de sua corporeidade em relação aos espaços físicos e imateriais das construções coloniais. Partindo da Corpa, enquanto conceito de dissonância de estruturas organizadas de gênero, abrindo caminhos ao cuidado das subjetividades dissidentes e a manifestação de sua própria presença enquanto identidade trans e indígena em contexto urbano. Através do resgate de sua ancestralidade, trabalha a memória, a subversão de símbolos, formas de ser-estar e combater no campo civilizado e institucional.
Minha cabeça comporta carne, matéria de vida, que se desenvolve em fluídas águas em tempos de calmaria e de trombas d’água. Me vejo ofertando esses peixes. Amarro-os em minha pele, sentindo as escamas a cortarem e a pressão dos corpos dificultarem a minha respiração. Permaneço imóvel até esquecer dos sentidos que residem em mim. Meu pescoço treme com o que ofereço, percebo que a carne quando fora do seu lugar, pesa e com tempo se decompõe. O cheiro se intensifica a cada pássaro que se aproxima, em outras condições, eles já teriam os devorado, mas a quentura do meu corpo os afasta. Por mim eu nadaria em águas, não acredito na natureza dessa oferta, mas quando a maré tá baixa é difícil de se caminhar pela terra debaixo do rio, o chão gruda nos pés enquanto sinto minha boca seca pedindo pela cheia. Me acostumo em não ver pelos olhos, em sentir meus lábios racharem. O sol que senti em minha pele do lado direito, já sinto estar em cima de mim. Questiono o porquê da ação. Penso em como a cabeça, peixe e rio se relacionam de diferentes formas para cada corpo que os encontra. Sinto perder minha cabeça no rio e encontrar outras. Me vejo ofertando esses peixes. Tento achar formas de não precisar ofertar. Busco compreender a malícia em negociar. O cheiro se intensifica. Escuto cada vez mais presenças próximas a mim, elas questionam se minha natureza está viva ou morta. Me finjo de morta. Meu corpo continua quente. Permaneço imóvel até esquecer dos sentidos que residem em mim.
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