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DODI LEAL

    Travesti educadora, performer e pesquisadora em Artes Cênicas. Profa. do Centro de Formação em Artes e Comunicação (CFAC) da Universidade Federal do Sul da Bahia (UFSB), em Porto Seguro. Realiza estudos e obras artísticas de performance e iluminação cênica, perpassando por ações de crítica teatral, curadoria e pedagogia das artes. Em 2020 foi curadora da Encontra de Pedagogias da Teatra: afetividades do saber riscar e arriscar no Eixo Ações Pedagógicas da 7a Mostra Internacional de Teatro de São Paulo (MITsp).

    Se você é mulher, por que não veste calça?

     

    Uma calcinha na cara não te basta para coçar

    Teu distúrbio social escapado precisa ser vestido.

    Tudo o que você vê, você pensa que pode caçar

    Cueca enfiada no teu cú te engasga né, querido?

     

    Sou mulher e não me corteje mais de condiçōes

    Por que se visto ou não visto te foge aos sentires.

    Uai, de que valem calças, calcinhas e teus calçōes

    Quando te falta corpo para bancar os meus devires?

     

    Aquendarinda, só posso com as roupas me descalar:

    Tenho barba e sou fêmea, uso batom e sou bizarra.

    O prazer que sinto com meu pau vai te desconfortar,

    Sou uma mulher trans machinha, vem logo, me agarra!

     

    Ensaiemos as saias, não agora para te polemizar

    Machista escroto é feito de borboletas sufocadas

    Dê mais gritos coloridos e verá o corpo desatachar

    Tecidos compridos podem vestir mentes encurtadas.

     

    Toda dor de em uma calça meus desígnios não caber

    Da imagem sepulcra de sexuar uma vida inteira e tua

    A tecnologia das calças parece às mulheres pertencer

    Já que saias leves foram desenhadas pras machas duras.

     

    Visto redes porque me criterio agora de um afogamento:

    O escopo sensológico de me arquivar expande meus toques.

    Mulheres contraditórias estas cheias de seus serenimentos:

    Conectadas e prazerozas elas tem testosteronas de choques.

     

    Calças ideológicas foram feitas para se vestir socialmente.

    Réplicas de insultos ao corpo, roupas choram em espelhos,

    Cada mulher trans que não se cirurgia casa virtualmente:

    Solteira política, é viúva antes de nascer seus desesperos.

     

    Casar-se com ideias ou calçar-se com ideias? Para escolher.

    Filosofia viada deve mestruar no macho palavras sangradas:

    Superar em caos os casamentos e os calçamentos é morrer.

    Pessoa queer se topa disto em gozo como formas des-sagradas.

     

    Espécie descalça e descalçada, mulher trans pode ser toda nua.

    Rasgadas por dentro, roupas tem sensos artificiais que fazem caber.

    Habito as suturas discursivas que me faz ficar pelada e não ser tua.

    Passiva de dedadas, vou fistar teu cérebro com meu despertencer.

     

    O transorgânico é feito do risco: não mais xadrez e bolinhas.

    Desenhar vestimentas que atravessam tesão nas diferenças.

    A anestesia afetiva quevocê vive tem paisagem mesquinha

    O sentir transviado desorganiza e dá chupada nas tuas tristezas.

     

    Indeterminação, o prazer arquiteta técnicas políticas de existir.

    Ligação entre pessoas, todas com cú, tem condição habitativa,

    Redes digitais nos anais. O cú da mulher vai as calças atingir:

    Banda larga da moda, ser mulher T é colar o cú cas amiga.

     

    Cú com cú. Cús com cús. Cús-cús.

     

     

     

    Bebê menino

     

    Nasci no frio de julho

    Boas vindas ao chorão

    Gordinho e buxexudo

    Que fofinho e bundão.

     

    Mas era menina.

     

     

     

    Pavor

    Quero te dizer o que tenho agora

    Do que foi vivo e contigo foi vivido

    Te fazer saber minha vaga memória

    Juro: não seria mais eu se tivesse esquecido.

     

    Lembranças pequenas de momentões

    Dois palhaços que podem fazer magia

    E todo o brilho dos dois corações

    Se unem agora para uma nova história.

     

    Não foi apenas contato de intimidade

    Nosso encontro foi conexão de vividade.

     

    Como poderia me julgar por entender:

    Que na falta de sexo e da presença física

    Eu não queria a nossa humanidade Perder de vista?

    Teu pavor de si mesmo te esconde de mim.

     

     

    De trans pra frente

    Poesia

    Editora: Patuá

    Ano: 2017

    Para consultas sobre vendas: muthabrasil@gmail.com

     

     

     

     

    COMO CITAR O MUTHA?

    O MUTHA é uma obra artística e um projeto científico autoral de Ian Guimarães Habib. Por esse motivo, o MUTHA deve ser citado junto de sua autoria, a partir da seguinte obra:

    HABIB, Ian Guimarães. Corpos Transformacionais: a transformação corporal nas artes da cena. São Paulo: Ed. Hucitec, 2021.